O Çairé é uma manifestação
tradicional do povo indígena Borari que ocorre há mais de 300 anos na
comunidade de Alter do Chão, composta por elementos religiosos e profanos. A
manifestação continua acontecendo por força, organização e mobilização da
comunidade, apesar das inúmeras tentativas de impedirem e de se apropriarem
dela.
O Çairé, para nós Borari de Alter
do Chão, é um corpo composto por vários membros da comunidade. Cada membro
desse corpo possui uma importância histórica e cultural dentro da manifestação,
porque são responsáveis pela organização, preparação e realização do Çairé. Os puxiruns iniciam os trabalhos preparando o
terreiro; as rezadeiras e os rezadeiros, os foliões, os mordomos e as mordomas
ensaiam as ladainhas e as folias; os barraqueiros, mordomos e mordomas fazem os
enfeites; os troneiros confeccionam o trono da coroa do divino; os artesãos
preparam os teçumes de palha para enfeites do barracão e barracas; as
costureiras tradicionais da comunidade confeccionam as roupas do Rito Religioso
e Profano (que são as danças tradicionais do Çairé); os catraeiros buscam e
transportam os mastros, que é a procissão fluvial no Lago Verde; sem deixar de
citar o Grupo Espanta Cão responsável pelas músicas tradicionais do Çairé tais
como: curimbó, desfeiteira, marambiré, entre outras; as dispenseiras
responsáveis pelo controle da alimentação; conduzem o ritual: juiz e juíza,
saraípora, capitão, sargento, moças das fitas, alferes, mordomos e mordomas,
rezadeiras e foliões.
Diante disso, consideramos uma
afronta ao povo Borari a atitude abusiva da Prefeitura Municipal de Santarém em
privatizar o Çairé. Repudiamos o edital 022/2019-semgof/semc que sob o pretexto
de “promover a integração, a inclusão social, a geração de emprego e renda e a
valorização do nosso Município pelo seu povo através da promoção de seus
atrativos turísticos, sua cultura e peculiaridades” excluí o povo Borari de sua
própria manifestação cultural. Acreditamos que a nossa própria forma de
organização já contempla e promove os elementos pretendidos no edital.
Gostaríamos de deixar claro, ainda, que o Çairé é sagrado para nós e não
aceitamos que uma empresa venha fazer a “produção de rito religioso e profano”
conforme prevê o edital.
De acordo com a Constituição
Federal de 1988, artigo 231 “são reconhecidos aos índios sua organização
social, costumes, línguas, crenças e tradições (...)” e segundo o artigo 6 da
Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), é necessário
“consultar os povos interessados, mediante procedimento apropriados e,
particularmente, através de suas instituições representativas, cada vez que
sejam previstas medidas Legislativas ou Administrativas suscetíveis de
afeta-los diretamente”. Nossa comunidade indígena Borari de Alter do Chão teve
seu direito de consulta prévia, livre e informada violado e nossa organização
social, nossos costumes, nossas crenças e nossas tradições não foram
reconhecidas nem respeitadas.
A comunidade reunida na sede da
Associação Indígena Borari de Alter do Chão no dia quinze de agosto de dois mil
e dezenove (15/08/2019) exige o cancelamento imediato do edital
022/2019-SEMGOF/SEMC e, após o cancelamento, uma audiência pública em Alter do
Chão para discutir o Çairé, aprova a nota e condiciona a não realização da
Festa do Çairé 2019 à observância do solicitado.
Assina
Comunidade Nativa de Alter do Chão.
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